Gabriel Santos, sócio da EXEC.
Especialista destaca que setor tem um funcionamento peculiar e demanda uma liderança humanizada, pragmática e objetiva
Nos últimos meses, várias notícias foram veiculadas na mídia sobre empresas de diversos portes do mercado financeiro anunciando demissões em massa de colaboradores. Uma das principais justificativas foi o momento desafiador atual vivenciado pelo setor, que tem como pano de fundo um ambiente macroeconômico cheio de incertezas. Para se ter ideia, de acordo com dados da B3, a queda do Ibovespa, principal indicador da casa, caiu 7,16% nos três primeiros meses do ano.
Esse cenário jogou luz no mercado financeiro no que diz respeito ao papel da liderança em momentos de crise. De acordo com Gabriel Santos, sócio da EXEC, consultoria especializada em Executive Search, a sua dinâmica peculiar demanda um perfil de líderes com características particulares. “O mercado precisa de profissionais que tomem decisões rápidas em relação a qualquer assunto, seja no que diz respeito à expansão, investimentos e até mesmo sobre demissões. As empresas do setor, assim como o próprio mercado vivem a base de expectativas, tendo sempre que estarem preparadas para o pior, o que demanda uma liderança forte”.
Santos reforça que a diferença entre uma liderança forte e uma liderança fraca está na maneira como transmite a mensagem para seus liderados, como a contextualiza, além de, neste momento, o líder tem que estar muito próximo a sua equipe. E uma das características fundamentais que diferencia ambos os líderes é a humanização. “Independentemente da decisão, um líder forte precisa ser bastante humano, além de muito pragmático e objetivo. Por outro lado, é um grande desafio conciliar tudo isso em um tempo conturbado. Além disso, conjugar a sensibilidade e empatia com o dinamismo e tomada de decisão”.
Despreparo da liderança: estragos na empresa
Uma liderança despreparada tem um forte impacto no time de uma empresa do setor financeiro, principalmente porque é um mercado intenso que tem um dia diferente do outro.
Um processo de lay-off mal feito gera uma onda de insegurança nos bons profissionais que têm talento, são bem avaliados e comprometidos. “Eles começam a questionar se estão no lugar certo, se vale a pena ficarem onde estão e acabam olhando para fora, em busca de mais valorização”, enfatiza o sócio da EXEC.
Saber lidar com esses momentos demanda algumas posturas dos líderes, que também têm receios e são seres humanos. “Eles precisam separar o CPF do CNPJ e é difícil direcionar isso da melhor forma. Aí entra também a questão da adaptabilidade, que se torna bastante relevante. Tem pessoas que vão ser mais frias no momento da saída de alguém, outras mais calorosas. Cabe ao líder saber ler essa pessoa e se ajustar ao seu perfil para conseguir concluir o processo de demissão da melhor forma possível, inclusive ajudando na sua recolocação”, reforça Santos.
Falta de investimentos por parte das empresas
Um dos grandes gaps do mercado financeiro no que diz respeito à formação de lideranças fortes é a falta de investimento em capacitação. “Nesse setor, o profissional é muito bom tecnicamente e cresceu na carreira por conta disso. Mas, de forma geral, há pouco investimento e atenção para a importância de investir em treinamentos de liderança e preparar melhor os líderes”.
De acordo com Gabriel, há uma cultura de que o líder do mercado financeiro é bom quando ele “é jogado na fogueira e sai ileso”. “Isso é muito cruel, pois as empresas acabam indo para um caminho de tentativa e erro, e não de preparação”, analisa.
Dicas para manter a motivação do time
Gabriel elencou algumas dicas importantes para os líderes do mercado financeiro manterem suas equipes motivadas quando a empresa navega em meio a tempestades.
1- Lembre seu time que o mercado financeiro é cíclico. Na visão do sócio da EXEC, esse é o primeiro ponto que deve ser levado em conta, principalmente porque o brasileiro tende a ser mais imediatista. “Historicamente, o mercado financeiro tende a ser mais positivo do que negativo. Por isso, é importante ajudar o time a pensar no longo prazo, assim como um investidor que investe em ações. Se ele quiser vender os papéis logo na primeira queda, vai perder dinheiro. O mesmo acontece com o colaborador. Ele perde as chances de ser bem-sucedido lá na frente”.
2- Esteja muito próximo da sua equipe. Em momentos difíceis, o líder precisa ser mais “hands-on” nas operações que tem que fazer e desempenhar, de fato, essa função. “Dedicar 30% das atividades dele para as suas entregas e os 70% restantes para a gestão, investindo em escutar os colaboradores, dar feedbacks, entender o que está acontecendo e ver o que pode ser melhorado”, diz Gabriel.
3- Mantenha a sinceridade. O sócio da EXEC afirma que a sinceridade ajuda as pessoas a se envolverem com o líder e a empresa. “O líder deve pensar no negócio como um todo, ser correto com as pessoas, sem omitir ou mentir para seus colaboradores. Dessa forma, você ajuda o time a se desenvolver. Isso é fundamental para que o líder crie robustez para passar as mensagens de forma correta”.
4- Faça os ajustes necessários para tornar o time mais eficiente. Neste caso, Santos ressalta que isso não envolve necessariamente fazer demissões, mas sim em termos de funções e tarefas.
5- Busque maneiras mais sistêmicas de obter eficiência profissional. De acordo com Gabriel, isso será fundamental para obter melhores resultados e manter o time motivado.
Próximos passos ainda lentos
Em relação ao futuro desse cenário de liderança no mercado financeiro, a opinião de Santos é clara: a mudança de mindset não vai ser rápida. “Empresas são feitas de pessoas. E grande parte dos líderes de hoje cresceram com essa mentalidade de “sobreviver na selva” e não sabem fazer algo diferente. Por muitas vezes cheguei a sugerir treinamentos de liderança para algumas dessas companhias e cheguei a ouvir que isso é gastar dinheiro com besteira”.
Por outro lado, as empresas que investirem em tornar suas lideranças mais fortes para navegar em mares revoltos serão mais consistentes ao longo do tempo. Além disso, os líderes hoje lidam com gerações de colaboradores mais novos, que tem uma maneira diferente de pensar.
“Eles não querem trabalhar somente por dinheiro, mas sim em um local que seja interessante para eles. No entanto, até se tornarem uma alta liderança, ainda temos alguns anos pela frente e as mudanças serão lentas. Seguiremos acompanhando tudo isso”, conclui.