O extermínio dos empregos

Meu primeiro contato com o fim de uma profissão foi em 1973, quando a Editora Abril decidiu substituir a linotipia, iniciando a produção eletrônica de textos. Foi um choque. Da noite para o dia dezenas de profissionais descobriram que tinham perdido o emprego. A profissão de linotipista foi sendo gradualmente extinta, começando pelas grandes gráficas até alcançar as pequenas. Esse movimento prosseguiu tanto pela substituição de processos de trabalho quanto pela perda de utilidade de algumas profissões como foguista quando os trens deixaram de ser movidos a vapor e motorneiro com o fim dos bondes.

O avanço das tecnologias existentes ou o surgimento de novas provocaram a redução de empregos ou a existência de tarefas que não demandavam pessoas para realizá-las.

No final da década de oitenta, o avanço tecnológico trouxe os primeiros robôs. A indústria automobilística foi uma das pioneiras a utilizar este recurso para substituir postos de trabalho. Em 1988, visitando uma fábrica da Fiat em Turim, levei um susto ao dar de cara com um robô que transportava os motores de uma bancada para outra sem ajuda de nenhum ser humano. O que hoje é corriqueiro, na época, para mim, era uma grande novidade que apontava para um futuro ainda pouco delineado ou sequer imaginado, a não ser na literatura de ficção científica.

As duas décadas seguintes trouxeram um grande aumento na automação, provocado de um lado pela continuidade do avanço tecnológico e, do outro, pelo aumento da competição entre as empresas que as colocavam na busca cada vez maior por produtividade. Elas descobriram que aumentar a produtividade das pessoas tinha limites facilmente superados por robôs e assemelhados. Merece um capítulo à parte o avanço no campo da Tecnologia da Informação.

A automação, além da produtividade, facilita a padronização, contribui para a segurança eliminando postos de trabalho perigosos ou insalubres, melhora a qualidade. Todo isto com um custo mais baixo. As máquinas não faltam ao serviço, não têm limites de horas extras, não tiram férias nem licença saúde.

A quantidade de vantagens impele as empresas a adotar uma política agressiva de automação.

Com ela, por exemplo, a indústria têxtil dos EUA recuperou boa parte da sua competitividade mesmo comparada aos países asiáticos. Na indústria alimentícia, ela permite maior ajuste às regras sanitárias. Certamente as empresas que trabalham automatizando fábricas ou produzindo equipamentos na área poderiam passar horas elencando as vantagens de seus produtos e processos.

Este quadro estimula a troca de trabalhadores por robôs, computadores, e outros equipamentos mais complexos como os usados pela indústria automobilística para soldar carrocerias e pintar os veículos. A indústria de alimentação fabrica, embala e despacha seus produtos com cada vez menos trabalhadores.

As empilhadeiras sem operador ficaram prontas antes dos carros sem motorista e funcionam com qualidade e segurança.

Na década de 1990 circulava entre o pessoal de RH uma piada que dizia que as fábricas do futuro teriam somente um operário e um cachorro, mas, que este seria terceirizado. Hoje já existem fabricas com um só trabalhador, mas, elas não precisam do cachorro.

Em 1999, o Grupo Krisis da Alemanha integrado por especialistas de diversas áreas e que se dedica a estudos no campo da economia e sociedade publicou um instigante livro intitulado Manifesto contra o Trabalho em que aponta que os empregos seriam cada vez mais raros e que o ser humano teria coisas mais nobres a fazer fora trabalhar. Advertiam as pessoas para ficarem atentas, pois, senão seriam enganadas pelos governos e sindicatos.

Uma coisa é certa. Estamos diante de um processo inexorável e evolutivo da redução dos empregos em todo o mundo e a pandemia tem contribuído para antecipar decisões que as empresas pretendiam tomar mais à frente. Elas estão antecipando as reduções de efetivo. Assim matam dois coelhos com uma só cajadada. Ajustam seus quadros e debitam os inevitáveis prejuízos de imagem na conta da pandemia. 

Há os que argumentam que surgirão novas ocupações. Isto é verdade, mas, elas serão insuficientes para atender a demanda das pessoas por emprego ou renda. Ademais, as competências e conhecimentos exigidos por essas novas ocupações não serão os mesmos ostentados pelos que perderam os empregos. Governantes, empresas e sindicatos estavam preparados para lidar com o desemprego conjuntural, mas são inaptos para enfrentar o desemprego estrutural.

Não há sequer um caminho sinalizado para resolver a crise que se avizinha. Não há um remédio que a cure, nem uma saída mágica. Com o tamanho da encrenca os países terão de colocar o tema em foco e repensar o pacto social existente, pois ele já faliu ou, no mínimo, está obsoleto.

Diante de tudo isso, restará inicialmente aos países, na medida de suas possibilidades, prover renda para um considerável número de cidadãos enquanto não se encontra uma solução definitiva.

José Emídio Teixeira

Professor de Relações de trabalho da Fundação Dom Cabral e diretor da Dialogar - Consultoria de Relações de Trabalho

José Emídio Teixeira – Foto divulgação

Compartilhe!